Parapsicologia RJ - Geraldo dos Santos Sarti

FUNÇÃO PHI

TEXTO ESCRITO EM 1979 e atualizado em Novembro/2008,
Constante do livro "Parapsicologia e Psicofísica", WZ, 1980.

  

G. S. SARTI
Dez/2008

 

A função phi exercida pelo sistema
de ativação reticular ascendente filtra
informação sintática a nível de conteúdo

 

Daremos inicialmente noção simplificada dos processos e transformações ocorridos no percurso que o objeto traça a partir de sua qualidade física como coisa até sua qualidade psicológica como representação.  Consideramos dispensáveis quaisquer detalhes epistemológicos ou ontológicos, tomando como dados primordiais o que a intuição nos dá de imediato em termos de percepção.  Por outro lado ressaltamos a importância do desenvolvimento sensório-perceptivo no sentido de preencher o vazio em que se encontram estudos a esse respeito quando realizados logicamente.

A perspectiva lógica tomada sobre a percepção sensorial dará uma visualização do absurdo em que se encontram os estudos neuro-fisiológicos e suas implicações nas potencialidades sensoriais.  Nossa figura básica será a linha quebrada que vai de A a D passando por B e C, com fases I, II e III.

O objeto enquanto coisa, estímulo distal, sofre distorções mecânicas, ondulatórias e geométricas advindas de suas propriedades materiais.  Na figura, o estímulo distal A é distorcido pela fase I e transforma-se no estímulo proximal B, sem perder sua fisicalidade e sua exterioridade em relação aos mecanismos nervosos receptores.  Toda a sua carga informativa está mantida durante a fase I sob o ponto de vista informal, pois nenhuma semântica está embutida no corpo do estímulo.  Obviamente está sendo omitida a possibilidade de haver um organismo emissor pensante, quando então provavelmente a potencialidade da informação seria de natureza simbólica, uma mensagem.  Para efeitos de concatenação lógica, mesmo na presença de um emissor, poderemos considerar o estímulo como distal bastando que adotemos inicialmente um ponto de vista behaviorista mecanicista solipsista existente por detrás da transformação do meio físico.  Operada a transformação distal - proximal, todo e qualquer objeto torna-se um efeito eletroquímico.

No caso, por exemplo, de uma radiação luminosa, após a focalização retiniana do cristalino, células especializadas recolhem o estímulo proximal e transformam sua fisicalidade radiante para a de impulso nervoso.  O estímulo é agora um impulso eletroquímico, mas a ausência de conteúdo permanece a mesma, tratando-se ainda de uma informação apenas sintática.  Como tal operam-se as transformações da fase II, desde o ponto receptivo B até o ponto afetivo C.  Mais especificamente, na fase II o estímulo proximal realiza uma modificação no meio extracelular do neurônio sensor, alterando-lhe o estado de repouso em que se encontrava antes da chegada da estimulação.

O deslocamento do estímulo pela via sensória dá-se por depolarização consecutiva de locais vizinhos do axônio do neurônio.  Tal depolarização é consequência de uma difusão de íons sódio Na+ através da membrana citoplasmática para o líquido intracelular.  O meio intracelular, anteriormente rico em íons cloro CL- mantinha um potencial de membrana negativo quando em repouso.  Por outro lado, era mantido, por um efeito do fenômeno chamado bomba sódio, um gradiente de concentração alcalina entre os meios intra e extracelulares às expensas da energia gerada pelo trifosfato de adenosina ATP no metabolismo do axônio.  Em outras palavras, pela estimulação proximal pode ser anulada a bomba - sódio permitindo o transporte do cátion para o interior da célula de forma a depolarizar a membrana e consequentemente alterar seu potencial negativo para o nível positivo.  Ao propagar-se pelo axônio o estímulo elétrico vai excitar através da fenda sináptica os corpos e dentritos celulares de outro neurônio, desenvolvendo-se assim a estimulação interneuronal.  O fenômeno de propagação sináptica dá-se pela segregação de substâncias sintetizadas nas vesículas do botão terminal do axônio, tais como a acetilcolina, a noradrenalina, a serotonina, e a dopamina, que irão alterar o líquido extracelular do neurônio pós-sináptico provocando supercondutância de Na+ para o interior da célula alterando-lhe o potencial de repouso da membrana para o nível de potencial de ação acima do limiar de excitação da célula.

Observamos que há uma seleção quando da recepção do estímulo em termos de limiar de excitabilidade e de especialização de receptores quanto à forma pela qual a informação é veiculada.  Ao nível sináptico, além do limiar de sensibilidade do potencial elétrico de ação, há inibição do mediador químico de excitação pela secreção de enzimas inibidoras quais sejam a colinesterase, a o-metil-transferase, a monoaminaoxidade mao, e adenil-ciclase inibidora (?).

Há ligações sinápticas especializadas por elicitação do estímulo por tipo de mediação, mesmo que o circuito neuronal não seja diferencial.  Deve ser atentado que a injeção ou o bloqueio químico de substâncias ativadoras provoca distúrbios percentuais e de efetuação muscular e endócrina. (Estados alterados).

Ocorrem facilitações por somação temporal de estímulos subliminares, isto é, quando o potencial de membrana estimulado não chega a atingir o limiar de excitação da célula.  Nesse caso, um potencial fraco termina no próprio axônio mas, somado a um estímulo consecutivo, pode ocorrer a inversão da polaridade mais facilmente do que o que seria conseguido se não tivesse ocorrido a primeira excitação subliminar.  Igualmente, após o exercício local de um potencial de ação, há uma fase refratária em que o potencial de membrana situa-se abaixo do seu nível potencial de repouso, prejudicando a propagação do sinal imediatamente posterior.  Claro  está que tal apresentação é simplificada tendo em vista não só o desconhecimento científico que ainda envolve a matéria mas também em função da extrema complexidade bio-eletroquímica que segue durante o percurso excitatório e na qual não é de nosso interesse aprofundar.

Em termos de disposição dos circuitos neuronais encontramos circuitos do tipos reverberativos excitatórios - excitatórios, inibitórios - inibitórios e mistos.  No primeiro dos circuitos, o estímulo recebe retroalimentação positiva e é amplificado.  No segundo, ocorre feedback negativo e o estímulo é amortecido enquanto no terceiro podem ocorrer amplificação ou amortecimento.   Ainda , em virtude do fato de que a intensidade do estímulo é dada pela soma espacial dos receptores terminais, isto como um efeito da lei do tudo - nada característica das ligações digitais, pode acontecer que determinada papila receptora seja aniquilada excitatoriamente pela circunvizinhança composta de pontos receptores estimuladores de neurônios inibitórios para aquele estímulo.  Em vista de tal exposição sucinta procedida, concluímos que da estimulação exterior representada em A e B, uma grande parcela de dados caóticos é filtrada, selecionada e inibida antes de atingir os processos representativos complexos integradores e decodificadores segundo padrões preestabelecidos ou estabelecidos pela atenção momentânea.  Constata-se que as operações de seleção e filtragem dadas na fase II do fenômeno perceptivo permanecem vazias de conteúdo e significado até o ponto C, no qual começam a esboçar-se os contornos de representações semânticas ainda ao nível afetivo.  Alertamos que a linearidade do processo perceptivo fica prejudicada pela superposição espacial das classificações comumente usadas para definição dos fenômenos bio-elétricos e afetivo - representativos. (1)

Assim, o ponto C é apenas um ponto lógico estando destituído de localização.  Sua importância reside no fato de que a partir dele a informação elétrica passa a possuir algum conteúdo semântico, sofrendo as vicissitudes da fase III até apresentar-se totalmente simbólica e representativa no ponto D.  Para o estudo da fase III do fenômeno perceptivo faz-se necessário estudar o sistema nervoso a nível filogenético, funcional e embriológico.  Simplificadamente o sistema nervoso compõe-se de uma parte periférica, os nervos receptores e efetuadores respectivamente.  Basicamente o SNC divide-se em encéfalo e medula.  Embriologicamente o encéfalo se subdivide em cérebro (telencéfalo e diencéfalo), tronco (bulbo, ponte e mesencéfalo) e cerebelo.  Tal divisão atende aos aspectos embrio-filogenéticos.  Funcionalmente o telencéfalo possui uma zona periférica cinzenta, o córtex, e uma região interna branca.  O diencéfalo por sua vez compõe-se de extensões dos gânglios basais, do tálamo e do hipotálamo.  O esquema a seguir permite visualizar a classificação, incluindo-se a formação reticular:

A classificação considerada filogeneticamente dá ideia de que as funções primitivas localizadas nas regiões pontinocerebelares-bulbares foram se deslocando evolutivamente para centros superiores de organização mais recente tais como o diencéfalo e o telencéfalo.  Evidentemente certos padrões primitivos de funções e comportamentos permanecem residualmente inferiores, tornando mais complexa a organização funcional do encéfalo no ser humano.  Tais funções primitivas são particulares reforçadores de impulsos arcaicos por troca de tendências com o telencéfalo.  Em termos sensoriais, a porção primitiva do tronco, evoluída ao diencéfalo, tende a forçar os controles córtico-sensoriais.  Nosso interesse aqui voltar-se-á para os sistemas ativador reticular ascendente SARA, situado até a altura do mesencéfalo, sensoriais-representativos, situados a nível cortical no telencéfalo e para o hipotálamo. (sistema límbico).  As áreas córtico-sensoriais cinzentas são as responsáveis pela resposta consciente à estimulação que evolui pelos circuitos nervosos.  No córtex são realizadas atividades superiores de decodificação de impulsos, integração sensório-perceptiva, análise e síntese de conteúdos e elaboração de símbolos.  Outras atividades diferenciadoras, intuitivas, elaborativas e de insight, mesmo efetuadas na topologia pré-consciente, podem ser creditadas no trato cortical.  Todas essas funções corticais contribuem definitivamente para o desenvolvimento do ser humano e é provavelmente devida a elas a manutenção da espécie em um meio hostil.  Outrossim, as possibilidades corticais-conscientes são restringidas estimativamente a um número finito médio de 7± 2 variáveis de trabalho (Langefors) e uma capacidade média de armazenamento para 16 bits de informação por segundo (Frank), números e taxas esses bastante inferiores ao que efetivamente se dirige aos centros conscientes e pré-conscientes.  Ao trato hipotalâmico e límbico além das atividades autoreguladoras homeostáticas involuntárias deve-se a localização das sedes do prazer e da dor altamente vinculadas à resposta afetiva.  Assim, o hipotálamo associa-se fundamentalmente aos princípios que regem a irracionalidade da vida inconsciente, ocupando o ponto C no nosso esquema linear e inicia o processo transformativo da afetividade para a lógica e sublinhada pela fase III.

Resta a formação reticular localizada no tronco encefálico.  Os impulsos nervosos que se dirigem ao córtex ramificam-se pelo sistema de ativação reticular ascendente cuja finalidade é ativar globalmente os focos corticais.  A atenção consciente é devida ao SARA, de forma que há uma filtragem exercida dinamicamente pelo sistema naqueles focos que não se tornam ativados.  O SARA defende o córtex da grande maioria dos impulsos perceptivos, embora estímulos extra - SARA sejam recebidos por focos específicos do córtex.

Veremos a seguir que é através dele que se exerce uma função de natureza extra-sensorial logicamente derivada da exposição.  Deve ser realçado que a atenção é dependente do SARA no plano da especialização cortical ao qual ele conecta.

Assim, não é o córtex o elemento filtrante da atenção, mas a própria formação reticular do SARA.  Como este constitui-se de um complexo de caminhos neuronais, não se tratando de tecido, não chega a constituir-se um um órgão determinado com funções determinadas no tronco, mas em caminho de derivação do impulso eletroquímico atingindo o que chamamos antes de circuitos reverberativos excitatórios - excitatórios e excitatórios - inibidores causadores da atenção, vigília e sono.  A questão central consiste em que a parte consciente do cérebro trabalha com um número finito de informações bem abaixo das informações potenciais contidas no meio ambiente.  Obviamente que tais informações sintáticas são selecionadas e filtradas na fase pré-sensorial II da percepção não chegando a atingir o nível semântico de representação D.  Ocorre claramente que para a sobrevivência da espécie, o reduzido número de significados conscientes é fundamental.

Claro está também que, se tais informações são filtradas antes de se tornarem conteúdos, o SARA parece ter uma função aleatória que no entanto poupa economicamente as atividades do telencéfalo.  Então, se no plano da percepção e da integração dos conteúdos só entram as informações necessárias, a seleção é proporcionada sobre um conteúdo potencial ausente manifestamente do processo sensorial.  A esta função cerebral daremos o nome de função Ø, cuja natureza tem que ser de ordem extrassensória.

Observamos que Ø participa de todos os processos perceptivos-integrativos-representativos do SER.  Duas condições se fazem necessárias.  A função Ø é uma função "incompleta" do ponto de vista da filtragem.  Assim, alguma parcela de informação sintática não apresentada como conteúdo é selecionada afetivamente no diencéfalo permanecendo um "status" apenas relativamente caótico que é o determinante de sonhos e alucinações.

Nos casos de inibição da MAO e de excitação dopaminérgica, além de alterações perceptuais, o SN se auto descarrega em conteúdos alucinatórios calcados em informações sintáticas memorizadas e que até então não tinham se transformado e que ocupavam as franjas da consciência.  O mesmo ocorre em situações arquetípicas quando os estímulos nervosos puros transformam-se em conteúdos aproveitáveis para o comportamento defensivo, ou de ataque-defesa.  O que é inconcebível na teoria funcional do SN e na psicologia é que o cérebro, não se desorganizando simbolicamente, não possua uma descrição detalhada da articulação existente, quando da seleção Ø, entre estímulo-impulso sintático e sua representação.  A dificuldade em articular a percepção à filtragem sensorial advém exclusivamente dos tratamentos unilaterais dados pelas teorias vigentes e do complexo desconhecimento da função Ø extra-sensorial.  Essa conexão eu chamei de LINK e sua expressão físico-matemática eu calculei como .

Como adendo  final, a função Ø talvez permita uma classificação epistemológica sobre as possibilidades cognoscitivas, eliminando o abismo existente entre o que se considera ser uma representação psicológica do objeto e  o objeto em si.  De atuação sistêmica sem sede orgânica, unicamente compreensiva apenas possível na medida em que ela, coisa, esteja semeada de um substrato platônico característico de sua ontogenia.  A base de todo o processo de percepção e conhecimento sendo esta função filtrante do SNC, representada em um complexo extrasensorial introduz a inquietação de que os rumos e explicações até então conhecidos necessitam sofrer uma alteração abrupta e uma abertura suficientemente grande para o intercurso filosófico de ψ na ciência.

(1) O leitor poderá ter uma boa síntese de "emoção" no Site "Neurociências - Realidade, cérebro e emoção" - Joe Dispenza, no Google.