Parapsicologia RJ - Geraldo dos Santos Sarti

INVERSÃO DO TEMPO

G. S.Sarti ABRAP / IPPP

novembro de 2009

Publicado 1980 em "Parapsicologia e Psicofísica" - Ed. WZ

Dedicado ao amigão
incógnito B.B.M.A. de FURNAS,
e da ELETRO NUCLEAR




A inversão do tempo como explicação
da precognição implica em degeneração
espacial generalizada estatisticamente
para macrossistemas.

 

Uma das tentativas para explicação do fenômeno precognitivo é a suposição de que o decurso dos eventos no tempo é uma "trajetória" de sequência inversa à lógica do percipiente do evento futuro.  Para tal percipiente o evento é presente no instante t embora a sequência normal dos acontecimentos devesse conduzir por exemplo a um evento genidêntico (Grümbaum) para o instante t + 1.

A similaridade com o filme invertido permite que se entenda uma possível interseção de sequências de eventos nos sentidos t+, e t-, possibilitando que o sujeito precognitivo receba uma informação sobre um momento do filme que não teria ocorrido ainda caso o sentido do filme lhe fosse diferente.  Alguma discussão sobre o assunto foi levantada por Norbert Wiener, criador da cibernética e pelo filósofo francês Raymond Ruyer.

O ponto principal consiste em que o percipiente do futuro, pela ausência de conhecimento sobre o encadeamento normal de eventos, perceberia o porvir como um dado fortuito sem maiores implicações à sua própria logicidade.  De alguma forma o percipiente não enquadraria o evento futuro como tal, passando portanto ele despercebido.  Isso explicaria porque tantas vezes premonições e precognições não são consideradas valiosas até o instante em que efetivamente ocorram, quando então o próprio sujeito se apercebe de que o pensamento referente àquele evento já lhe havia ocorrido.  Tais informações fortuitas podem entretanto estabelecer relações dos tipos lógicos e afetivos, ainda que imperfeitos, com os eventos presentes.  Haveria certamente um salto lógico, mas algumas características de tais formações, principalmente as de cunho afetivo, poderiam permanecer mais ou menos intactas.  Aliás, as grandes certezas precognitivas são oriundas de um aprofundamento dramático que mantém o sujeito alerta para o futuro que a ele surge de maneira ameaçadora.

Entretanto, a perspectiva de Wiener é oposta ao raciocínio exposto.  Supostamente ele julga dois indivíduos para os quais os tempos transcorrem inversos e conclui que a comunicação entre eles é impossível tendo em vista que as lógicas de ambos também estão invertidas.  Sendo assim, uma comunicação consequente de um deles torna-se antecedente para o outro, naturalmente.  Em função dessa naturalidade, nenhum dos dois consegue perceber a comunicação como uma mensagem.  Observamos porém que o foco de atenção de Wiener está deslocado da inversão física do tempo para a inversão da lógica de dois mundos, não se tratando de uma inversão sobre eventos de caráter genidêntico perpassados em um determinado corpo.  Tal aspecto será fundamental a seguir, em virtude, inicialmente, da não aplicabilidade da teoria da relatividade especial ao fenômeno PG.  Como a identificação de um corpo ou partícula permite uma descrição simples da causalidade, a PG sobre eventos genidênticos é impossível do ponto de vista da TRE pelo fato de ter-se uma velocidade máxima de propagação de causa-efeito.  Entretanto verifica-se que algumas partículas estudadas por Feynman percorrem tempos inversos às de sua antipartículas e que isso parece implicar em uma negação do conceito de genidentidade.  Tomamos por base a descrição do fenômeno segundo Reichenbach, retirado de Lacey.

Dentro do campo nuclear ocorre o fenômeno conhecido como "produção de par" e que resumidamente consiste na transformação da energia fotônica contida no raio gama em duas partícula e antipartícula nucleares, respectivamente elétron e pósitron.  A equação física dessa transformação é:

.

Inversamente, ocorre o fenômeno de "aniquilação de par", dado pela equação física:

,

na atual o fator 2 é usado para atender à condição de conservação de energia, não envolvendo modificações quanto à natureza do processo.  Essas duas transformações energia-matéria são possíveis pela veracidade da conhecida equação:

E  =  mc2,

não sendo portanto estranháveis.  Na figura a seguir consideramos a sequência de transformações da natureza provocada consecutivamente pela produção e pela aniquilação do par.  Nas linhas cheias consideramos a presença da antipartícula e nas tracejadas, sua ausência, substituída pela presença do elétron.

Podemos observar através do percurso das linhas cheias que o evento de produção ocorre antes do de aniquilação e que três partículas distintas   percorrem tempos positivos assegurando continuidade ao processo.  Até este ponto ocorre efetivamente o que seria possível de se esperar.  Atentando-se para o percurso BC de , verificamos que substituindo este por sua antipartícula, e, as equações físicas transmutam-se em

,

de tal sorte que, além de serem eliminadas a produção e a aniquilação de pares, a identidade do elétron é mantida em todo o percurso DCBA.  Outrossim, "e" percorre entre BC um sentido temporal negativo, tracejado, inverso ao percorrido por sua antipartícula.  Como as equações físicas para o percurso tracejado não envolvem modificações de massa-energia, a identidade do elétron permanece.  Tratar-se-iam pois de eventos C e B genidênticos com uma fase temporal inversa e portanto bastante afeitos à explicação da PG.  Todavia a genidentidade de todo o processo conduz ao paradoxo de que a mesma partícula ocupa simultaneamente em to, três posições espaciais distintas, em substituição à existência de três partículas distintas.  Isto abre a necessidade de introdução em parapsicologia do conceito "genidentidade espacial degenerada".  Esse conceito fica caracterizado pela inversão do tempo, manutenção e inversão da lógica de eventos sobre um mesmo corpo e multiplicidade espacial dos novos eventos causais.

Em outros termos, a inversão do tempo promovendo alterações nas relações de causa e efeito, que passa a ter o sentido do efeito à causa, implicam em "mesma existência" em vários Loci.  Esta conclusão envolve a necessidade das percepções do tipo PG possuírem uma parcela de clarividência CV.  As percepções CV importam em GED porque os mesmos eventos ocorrem simultaneamente na mente do percipiente e no seu local "próprio" de ocorrência.

Deve ser interpretada a exposição acima como uma tentativa de reconstrução do universo já que ela envolve elementos próprios e anti do mundo físico reconhecido.  A questão a ser criticada é de como eventos macroscópicos podem ser induzidos a partir de especulações sobre partículas fundamentais.  Haveria no caso universos de antipartículas ocorrendo simultaneamente e temporal inversamente a algum universo constatável, de forma tal que interseções não destrutivas pudessem acontecer entre eles?  É evidente que a passagem do micro para o macro tomando por base a GED tem por única saída a suposição de semelhante anti-universo, hipótese não original.  Pode ser verificado entretanto um outro aspecto da questão geral qual seja o da adequação do microcosmo e do macrocosmo em bases estatísticas.  Nossa suposição da inversão temporal com consequências físico- lógicas evidentes sobre o conceito de genidentidade pode se embasar no fato de que tal inversão e suas consequências são funções probabilísticas.  Recordamos que o tratamento particular está preso às densidades de probabilidade dadas nas funções de distribuição estatísticas.  O mais claro exemplo é o da simetria das leis mecânicas.

A segunda lei da termodinâmica nos diz que uma entidade, a entropia S, de um sistema isolado evolui no tempo segundo a expressão:

,


Supondo um sistema de N partículas, a segunda lei estabelece que a degradação da energia do sistema cresce com sua evolução, se o número de partículas é constante e não há choques com partículas externas ou qualquer forma de troca de energia.  Em outras palavras, há uma tendência progressiva do sistema em atingir um estado de distribuição energética, de suas partículas, de equilíbrio dinâmico para o qual a produção e trabalho dele proveniente se torne mínima.

A expressão estatística da entropia é dada por:

,


em energia por temperatura, dados por K, constante, sendo P a probabilidade do estado de distribuição energética das partículas do sistema.  Esta expressão pode ser manipulada para:

,


sendo H a quantidade de informação do sistema.  As condições mecânicas do sistema são basicamente descritas pela posições x e pelas velocidades v de suas partículas.

Vamos supor que em um instante O do sistema I isolado tenha-se:

.


Para o mesmo sistema, no instante 1 ter-se-á:

.


Pela segunda lei, evidentemente:

.


Especulemos que as condições iniciais de
I sejam invertidas, particularmente o tempo, com consequênte inversão das velocidades das partículas.  Como as equações macromecânicas são todas reversíveis, isto conduz a um choque com a segunda lei, como a seguir:

Supondo um sistema isolado II tal que:

,


da simetria mecânica obteremos para o sistema
II, decorrido o tempo 1:

.


Então nos deparamos com a desigualdade paradoxal derivada da inversão do tempo:

.


Tal significaria um ganho de informação ocorrido na evolução temporal do sistema isolado.  Em verdade alguns princípios mecânicos deverão ser revistos em atenção ao exposto.  Em segundo lugar, o que explica a possibilidade da equação paradoxal é a abordagem de grupos.  Do ponto de vista isolado, a inequação acima pode ocorrer com um certo grau de chance dentro de uma dinâmica de partículas que faz o conjunto evoluir a um estado mais provável.

Isto nos leva a uma segunda interpretação da GED; é a de que a natureza dos fenômenos PG e CV subjacentes, perpassados sobre eventos de macrossistemas, é estatística.  Em outros termos tanto a "interseção de universos" depende fisicamente da noção de probabilidade como os eventos de menor compreensão são mais provavelmente percebidos precognitivamente.  A experiência comprova que as premonições e vagas estesias superam muito as percepções extra-sensoriais diferenciadas, nubladas que ficam até pelo seu tonus afetivo.  Como os eventos da afetividade são compreendidos em essência pelo seu caráter emocional, ficando a parcela física do evento desdiferenciada quando colocada em contrapartida com sua carga de efetividade, a probabilidade de que esteja ocorrendo inversão do tempo torna-se maior.

Mais uma vez remetemos à inadequabilidade da TRE na descrição do processo precognitivo.  Fundamentalmente a TRE admite identidades de partículas sobre as quais ocorrem eventos que casualmente não excedam a velocidade da luz.  Como em nossa abordagem encontra-se uma partícula simples capaz de transcender as expectativas da TRE, pela sua característica de ser uma antipartícula daquela que torna o processo coerente com a TRE, esta não fica invalidade porque pode ser integralmente transportada para o universo das antipartículas.  De alguma forma a TRE seria válida para cada universo degenerado ao qual seja aplicada, ficando por outro lado sem valor sua generalização a todos os universos observados.  Como a PG suposta a inversão do tempo, trata-se de GED, o fenômeno realmente foge às considerações tecidas pela TRE abrangente que é apenas de cada universo tratado de per si.

Com relação ao tempo, podem ainda ser formuladas duas hipóteses genéricas.  A primeira delas é a da inversão parcial do tempo, tal qual pode ocorrer com duas trajetórias espaciais comuns.  Nesse caso, alguns eventos seriam abrangentes em um sentido mais que em outro, de tal maneira que a interseção temporal se daria não punctualmente mas segmentarmente.

Na inversão parcial o percipiente PG observaria uma cadeia de eventos maior ou menor em função da abrangência de um dos sentidos de eventos.  Não é difícil exemplificarmos usando a idéia de intenção de Ruyer, na qual a intenção seria abrangente de uma série de signos do sujeito que a mantém de forma tal que um segundo sujeito percipiente seria capaz de prever a intenção final através dos primeiros signos.

A segunda hipótese genérica é a da modificação do ritmo do tempo, tal e qual o ritmo da matéria, supondo que ele também possua um ritmo.  Se o ritmo é mais lento, os eventos que percorrem a trajetória temporal são mais globalizantes, como a hipótese de Ruyer acima exposta.

Finalizamos o capítulo considerando que as parcelas de emotividade desempenham um papel primordial nas várias suposições sobre as possibilidades de modificações no sentido e no ritmo dos eventos no tempo, seja por afrouxamento de barreiras do ego -superego seja por uma exacerbação dos impulsos do id, pessoal ou arcaico, contra os mecanismos de defesa.  Esta é a saída mais plausível de explicação, a nível psicológico, para o "ilógico" encadeamento dos problemas físicos inerentes às modificações das sequências temporais.